A casa no lago | Resenha
- Michelle Leonhardt
- Aug 17, 2023
- 6 min read
Updated: May 25, 2024
Olá pessoal,
Hoje vim aqui para falar sobre um livro de não ficção extremamente interessante, sobre a história de uma casa e seus habitantes. Quando eu bati o olho nesse livro já fiquei apaixonada pela sinospse e acabei ganhando de amigas minhas que também são leitoras na ocasião do meu aniversário (2022). Já vou começar com os detalhes da obra e depois as impressões.

Título: A Casa no Lago
Autor: Thomas Harding
Editora: Anfiteatro
Ano: 2017 (Brasil)
Páginas: 398
Gênero: Não ficção, família, edifícios históricos
Título Original: The House by the Lake: a story of Germany
Minha avaliação: ⭐⭐⭐⭐⭐ (5/5)
Sinopse: UMA CASA. CINCO FAMÍLIAS. CEM ANOS DE HISTÓRIA. Na primavera de 1993, Thomas Harding foi a Berlim levando sua avó em visita a uma casa à beira de um lago. A avó dizia que ali era seu “lugar da alma”, um santuário que ela fora obrigada a abandonar quando os nazistas tomaram o poder. A viagem era uma chance de ver a casa pela última vez, de recordar como era. Mas estava muito diferente. Vinte anos mais tarde, Thomas voltou a Berlim. A casa estava abandonada, deteriorada, em vias de ser demolida. Uma pista de concreto cortava o jardim, deixando a marca de onde existira por quase três décadas o Muro de Berlim. Por toda parte se escondiam sinais do que tinha sido belos azulejos azuis decorados cobertos por um papel de parede, fotografias antigas caídas entre as tábuas do chão, entulhos cobrindo os caminhos de pedras do jardim. Vestígios das cinco famílias que tinham morado ali num período tumultuado. Começando no final do século XIX e entrando pelos dias atuais, passando pela devastação de duas guerras mundiais, pela divisão e reunificação de uma nação, A casa no lago traz relatos de união e alegria em família, de terríveis sofrimentos e tragédias, e de um ódio perpassando gerações.
Trata-se da história de uma casa que se transformou e transformou a vida de todas as pessoas que nela tiveram a oportunidade de viver. A história começa com a ida do autor até a casa, depois de ela estar abandonada por 12 anos, por conta de um presente de sua avó Elsie, que dizia sempre que aquele era seu "lugar de alma". Ela entregou a ele dois passaportes alemães e um pedaço de tecido com o desenho de uma estrela amarela.
Assim, ficamos sabendo que a casa fora construída por seu bisavô, para o descanso da família, mas que, com a chegada da Segunda Guerra Mundial, a família teve que fugir para Inglaterra, deixando a casa para trás. A partir desse ponto o autor começa a intercalar a história de sua busca pela preservação e posse da casa com a história de todas as famílias que lá residiram ao longo dos anos, sempre fazendo uma contextualização política e social bem abrangente.
"[...] é a história de uma construção que foi amada e perdida por cinco famílias. Uma história dos momentos do dia a dia que fazem da casa um lar - tarefas matinais, refeições da família à volta da mesa da cozinha, cochilos nas tardes de verão e fofocas acompanhadas de café com bolo. É uma história de tragédias e triunfos domésticos - de casamentos e nascimentos, encontros secretos e traições, doenças, intimidações e assassinato." (pg. 30)
No início, ele nos mostra como era a vida antes da própria construção da casa, explicando os detalhes da região e da vida dos donos da terra onde o lago Glienicke se encontrava. O terreno onde a casa se situava pertencia a um nobre senhor de terras, que conseguiu se destacar em meio a um contexto onde a riqueza "construída" representava menos do que a riqueza "de berço". Vamos conhecendo suas estratégias para se encaixar e se tornar conhecido e respeitado na sociedade da época.
Quando a Alemanha entra em crise econômica, ao fim da Primeira Guerra Mundial, essa família dona das terras já não consegue manter a propriedade financeiramente e, por isso, faz um "arrendamento" de trechos da propriedade para famílias endinheiradas construírem seus refúgios de verão. Neste ponto, conhecemos a família Alexander (antepassados de Thomas), que ali levantam a pequena casa de madeira, a casa do lago.
"Na minha família, essa era a história de Glienicke: um lugar que foi amado, depois roubado, localizado num país agora injuriado." (pg. 28)
Com a chegada da segunda guerra, os Alexander são obrigados a deixar a casa e fugir. A família, de modo geral, rompe relações com a Alemanha e nega seu passado, exceto por Elsie (a bisavó de Thomas, mencionada acima). Nessa fuga, a casa passa a ser habitada por um grande compositor alemão, muito famoso na época, que se alia ao regime nazista.
"Como acontece frequentemente em tempos de crise, a desgraça de uns é a oportunidade de outros." (pg. 128)
Ao fim da Segunda Guerra, com receio do julgamento de Nuremberg e a chegada da Guerra fria, o compositor deixa a casa e a mesma passa a ser habitada por uma viúva e seus filhos. Pouco tempo depois, por ordens do governo, a casa passa a ser dividida entre duas famílias: além da viúva, também outra família, de um informante da polícia secreta. Esses passam a conviver com o Muro de Berlim, passando praticamente no quintal.
Dentro de todos esses contextos, o autor vai nos mostrando o dia a dia de cada uma dessas famílias, suas alegrias e seus receios, todos os momentos vividos e a relação entre cada uma delas e a casa. Ao mesmo tempo, vai narrando sua luta para recuperar e preservar toda essa história, sua lutra frente a burocracia alemã e sua vitória.
"Cem anos depois da propriedade de Otto Von Wollank ter sucumbido aos problemas econômicos com a Primeira Guerra Mundial, depois do colapso da Alemanha Imperial, da República de weimar, do Terceiro Reich, do comunismo e da reunificação, depois de cinco famílias terem se perdido de amores por aquela terra e a perderem, depois de doze anos de abandono, por fim a casa tinha um belo futuro." (pg. 345)
Opinião
Vou ter que começar dizendo que eu amei demais essa leitura. Eu gosto muito de história e foi muito interessante ver um período tão grande da história da alemanha contado de uma maneira diferente, sob a perspectiva de diferentes famílias, cada uma com uma bagagem diferente, em momentos diferentes da história mundial.

O que mais me encantou foi certamente a riqueza de detalhes da obra. O autor fez uma pesquisa bem extensa, entrevistou vizinhos, famílias... não só as que habitaram na casa, mas também famílias da região. Por este motivo, o autor conseguiu entregar no livro, além do texto, fotografias de alguns dos habitantes da casa, documentos importantes, mapas e árvores genealógicas. Cada transformação interna da casa, por exemplo, está documentada com a devida apresentação da modificação da planta baixa.
Na minha opinião, os trechos que relatam a Guerra Fria e o muro de Berlim foram os mais marcantes. O muro passava a 40m dos fundos da casa e tapava o lago. As famílias moradoras do trecho estavam dentro da zona de segurança e, por isso, não podiam receber visitas, além de precisarem de passes para sair e voltar do trabalho (mesmo dentro da alemanha Oriental). A construção do muro também tem passagens bem marcantes:
"O pequeno Bernd Kuhne não entendia nada do que se passava. O dia estava quente e ele, ignorando os trabalhos e os guardas, engatinhou por baixo da cerca até a margem do lago. Horrorizada, Irene viu o menino se debatendo na água, mas era incapaz de chegar a ele por causa da cerca. Por fim, um guarda acudiu, tirou a criança do lago e entregou a Irene, dizendo-lhe que tomasse conta dos filhos." (pg. 235)
Outro ponto bem marcante é perceber as opiniões diferentes das pessoas sobre assuntos bem polêmicos, ainda que todas as pessoas fossem de uma mesma família. Enfim, encerro com um quote que resume bem o enredo e deixo a recomendação do livro para quem gosta de não ficção (e de história).
"É a história da Alemanha durante um século de turbulências. A história de uma edificação que aguentou as mudanças sísmicas que abalaram o mundo. Pois, à moda própria, quieta e esquecida, a casa esteve na linha de frente da história - a vida de seus habitantes cortada e refeita repetidamente, tão somente por causa do lugar em que viviam." (pg. 31)
Obs. Pra quem se interessou, a casa hoje é um museu que recebe visitantes, se chama AlexanderHaus. O autor também produziu um documentário que pode ser assistido através desse link.
Com certeza vale a pena!
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