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Resenha | O sal das lágrimas (Ruta Sepetys)

  • Writer: Michelle Leonhardt
    Michelle Leonhardt
  • Jun 26
  • 8 min read

Hoje venho comentar sobre as minhas impressões acerca do livro de uma autora que sempre quis conhecer. Estou falando da Ruta Sepetys que já tem três livros publicados aqui no Brasil: "Cinzas na neve", "O sal das lágrimas" e "O fim dos sussurros". Tenho os três livros dela em casa, mas, no meio de tantos outros, a oportunidade nunca surgia.


No desencalhe do mês de maio ele acabou sendo indicado por amigas, então decidi que era hora de finalmente conhecer o estilo da autora.



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Título: O sal das lágrimas

Autor:  Ruta Sepetys

Editora: Arqueiro

Ano: 2019

Páginas:  320

Minha avaliação: ⭐⭐⭐⭐⭐ (5/5)



Sinopse:  

"Joana, Emilia, Florian, Alfred. Cada um de um país diferente. Cada um caçado e assombrado pela tragédia, pelas mentiras e pela guerra. Enquanto milhares fogem do avanço do exército soviético na costa da Prússia, os caminhos desses quatro jovens se cruzam pouco antes de embarcarem em um navio que promete segurança e liberdade. Mas nem sempre as promessas podem ser cumpridas...

Profundamente comovente, o sal das lágrimas se baseia em um acontecimento real, o navio alemão Wilhelm Gustoff foi afundado pelos russos no início de 1945, tirando a vida de mais de 9 mil refugiados civis, entre eles milhares de crianças. É o pior desastre marítimo da história, com seis vezes mais mortos que o Titanic."



O que falar desse livro?


Preciso começar falando que foi um livro diferente. Diferente porque os capítulos eram curtíssimos (alguns com apenas uma frase!), mas com uma intensidade bem marcante. Confesso que no começo eu estranhei um pouco pois quando eu estava começando a me conectar com um determinado personagem, o ponto de vista já era interrompido para o ponto de vista de outro.


Nessa história, acompnhamos quatro pontos de vista distintos:


Primeiro temos Joana, uma jovem enfermeira lituana de 21 anos que tem uma experiência prévia como assistente de um médico. Ela é apresentada ao leitor enquanto está caminhando com um grupo de refugiados em direção ao porto pois pretende embarcar em um navio para poder voltar para a Alemanha. Ela carrega um segredo muito doloroso relacionado à sua família, mas demonstra compaixão e dedicação aos feridos e aos companheiros de grupo.


Os outros personagens principais dessa história são:


Emilia: uma menina polonesa de 15 anos, nascida em Lvov, que inicia o enredo andando sozinha. Ela está grávida e seu caminho vai cruzar com o dos outros protagonistas.


Florian: um jovem soldado prussiano, de cerca de 19/20 anos, que também busca fugir, mas ele carrega um segredo com ele. Ele também irá encontrar o grupo no decorrer da história.


Por fim, o último protagonista é Alfred, um marinheiro meio paspalhão e com mania de grandeza, que inicia o enredo alocado no porto, trabalhando nos navios.


O grupo original de Joana tem alguns outros personagens secundários: temos um senhor de cerca de 55 anos, especialista em calçados (chamado de "Poeta dos calçados"), um menino de 8 anos (chamado de "menino errante"), uma mulher corpulenta (chamada de "giganta") e uma jovem cega.


"Que grupo o nosso! Uma garota grávida apaixonada, um sapateiro bondoso, um menino órfão, uma moça cega e uma giganta que reclamava de todos bloquearem seu caminho, quando era ela própria quem mais ocupava espaço. E eu, uma jovem solitária que sentia saudade da família e implorava por uma segunda chance." (Joana - p.103)

Através desse grupo diverso a autora nos presenteia com uma história incrível sobre resiliência, força e luta. Acompanhamos a trajetória de cada um em busca de uma sonhada liberdade, desde o trajeto que percorrem a pé pelo frio e pela neve até a tentativa de fuga através do navio Wilhelm Gustloff.


"Está confirmado que partirei no MV Wilhelm Gustloff, o navio mais impressionante do porto! É imenso: 208 metros de comprimento, 56 de altura, e tem apenas 8 anos. Um verdadeiro portento! Originalmente, foi construído para cruzeiros de férias, e possui algumas comodidades que lhe agradariam, creio: piscina, um salão de jantar formal, salão de baile e biblioteca." (Alfred - p.69)


Sobre o navio Wilhelm Gustloff



O navio Wilhelm Gustloff foi um navio usado na chamada operação Aníbal, que foi uma iniciativa de evacuação marítima da força alemã e de civis durante a Segunda Guerra Mundial, da região da Prússia e arredores enquanto o exército vermelho avançava.


"O alto comando alemão havia organizado rapidamente uma evacuação maciça por mar. Deram-lhe o nome de Operação Aníbal, em homenagem a um dos maiores estrategistas militares da história. Um enorme comboio de navios seria despachado para o Ocidente." (Alfred - p.53)

Tratava-se de um navio imenso, inicialmente construído como um navio de lazer, mas que transportou em torno de 10.000 pessoas, muito além de sua capacidade de um pouco mais de 1.500 pessoas.


"- Não há tempo suficiente - observei a um de meus superiores. - Não creio que seja possível registrar e embarcar centenas de milhares de pessoas em questão de dias, senhor. - Você tornará possível - foi a ordem." ( Alfred - p.53)

O fato de ter 10.000 pessoas em um navio com capacidade para cerca de 1.500 já nos dá o tom de como as pessoas passaram o tempo lá dentro.


"O Wilhelm Gustloff tinha cinquenta banheiros, cem chuveiros e 145 vasos sanitários." (Joana - p.175)

Esse navio foi batizado em homenagem ao líder do partido nazista suíço, que foi assassinado em 4 de fevereiro de 1936. Foi construído para um programa chamado "Força através da alegria" da frente trabalhista alemã com o objetivo de subsidiar atividades de lazer para os trabalhadores do país, claro, com tudo calculado para passar a mensagem do partido.


Interessante que, durante o enredo, a autora dá muitos detalhes históricos. No trecho abaixo, por exemplo, ela fala sobre o nome do navio, traçando um paralelo com o enredo que criou:


"O Wilhelm Gustloff estava prenhe de almas perdidas, concebidas na guerra. Essas almas entupiriam seu ventre e ele daria à luz a liberdade delas. Mas será que alguém percebia? O navio fora batizado em homenagem a um homem, Wilhelm Gustloff. Meu pai me falara dele. Tinha sido o líder do Partido Nazista na Suíça. Fora assassinado. O navio tinha nascido da morte." (Emilia - p.172)

Eu não conhecia a história desse navio e fiquei bem impactada em saber que foi um desastre marítimo em proporções maiores que o Titanic. O Titanic matou cerca de 1.500 pessoas enquanto que o Wilhelm matou cerca de 9.000 pessoas. Foi realmente catastrófico.



Minhas impressões:


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Sou muito atraída por livros de ficção histórica. Gosto bastante da sensação de urgência, dos dilemas morais, da complexidade dos personagens colocados à prova. Livros assim costumam me prender com mais facilidade, me fazem virar as páginas sem nem perceber o tempo passar. Não sei, mas há algo na gravidade dessas narrativas que me fazem conectar mais com o enredo, como se eu precisasse sentir o peso e as consequências reais enfrentadas pelos personagens para me envolver de verdade.


Como quase todas as histórias de ficção histórica, essa também tem uma carga emocional imensa. Acompanhamos o ponto de vista de cada um e o que a guerra é capaz de fazer com as pessoas, tanto para o lado positivo, como para o lado negativo.


Enquanto cada personagem caminha pela neve em busca do porto, deve lidar não só com os seus dilemas pessoais, mas também com o grupo constituído. É através da união desse grupo de pessoas tão diferentes que se consegue a força para seguir adiante. Costumo dizer que as histórias de guerra mostram para nós leitores a força do ser humano. Elas são histórias tristes sim, mas com uma reflexão incrível sobre empatia e resiliência, quando nada mais existe para se contar além das próprias pessoas.


"A guerra havia tirado a cor de tudo, deixando nada além de uma tempestade de cinza." (Emilia - p.212)

Cada personagem luta com sua própria dor e carrega seus conflitos internos. Joana, por exemplo, luta com a culpa. Ela se coloca como assassina e carrega o tempo todo um peso emocional. Florian carrega o peso do destino, Emilia o da vergonha e Alfred o do medo.


O enredo também levanta algumas coisas que eu desconhecia. Não vou falar muito para não dar maiores spoilers, mas a obra também apresenta uma obra de arte roubada, a chamado "Câmara de Âmbar" (mais detalhes históricos podem ser contrados nessas fontes: matéria do UOL, matéria de Aventuras na História, Wikipedia, matéria na BBC).


"Originalmente criado na Prússia e oferecido como presente a Pedro, o grande, o Salão de Âmbar era uma câmara cintilante de âmbar, pedras preciosas, ouro e espelhos. Em 1941, os nazistas o roubaram do Palácio de Catarina, em Pushkin, perto de Leningrado. Embalado em 27 engradados, o Salão de Âmbar era a culminância dos sonhos artísticos de Hitler. Ele elaborou uma estratégia cuidadosa para guardá-lo em segurança e, após muita deliberação, os 27 engradados foram despachados em sigilo para o museu do Castelo de Königsberg." (Florian - p.100)

 

Sim, esse enredo também tem uma história de roubo! Chocada fiquei já que eu não esperava por isso!


Enfim, a tensão presente nesse livro é grande, algo acontece o tempo todo, mas a escrita em capítulos curtos consegue suavizar um pouco o impacto. Mas não podemos nos enganar pela suavização pois as pessoas depositaram todas as suas esperanças em um navio, algo bem doloroso de se acompanhar.


"O Gustloff era o meu bunker. Senti uma respiração funda se formar. Toda a luta e a preocupação. Poderiam estar quase acabando?" (Joana - p.210)

Não é um spoiler que o navio sofreu um ataque, então sabemos que a maioria das pessoas a bordo morreram. Só que, no meio daquele caos, vidas vieram ao mundo, algo que a autora personificou na personagem de Emilia.


"Avançou alguns passos e apontou para a bebê: - E, no entanto, em meio àquilo tudo, a vida cuspiu no olho da morte." (Emilia - p.219)

No livro, acompanhamos a derrocada do navio e o destino dos personagens principais e secundários até após o naufrágio.



Vale a pena ler?



Sim, vale muito. A narrativa pode parecer estranha no começo, mas é bem fácil se acostumar. O contexto histórico é muito bem colocado no decorrer do enredo e a resiliência do ser humano fica bem evidente.


"Justamente quando você pensa que esta guerra lhe tirou tudo que você amava, conhece alguém e percebe que, de algum modo, ainda tem mais para dar." (Florian - p.251)

Fiquei sabendo através de amigas que esse livro se conecta com outro da autora que se chama "Cinzas na Neve". Isso ocorre através da personagem Joana, que é prima de Lina, uma personagem do outro livro. Lembram quando eu falei sobre carregar um segredo familiar? Não li o outro livro ainda, mas Lina é citada rapidamente na história e já é possível compreender a ligação.


Ainda sobre os personagens: é possível se identificar com cada um dos personagens, pois todos vivenciamos os sentimentos predominantes a cada um em maior ou menor grau durante a vida, ainda que não da mesma forma que eles.


"Será que a guerra nos tornava perversos ou apenas ativava uma perversidade que já espreitava dentro de nós?" (Florian - p.64)

Por fim, achei legal que o título do livro fez menção a uma citação presente nele:


"O sal de suas lágrimas havia borrado a maquiagem dos olhos." (Alfred - p.267)

É nesse detalhe delicado - a maquiagem borrada pelo sal das lágrimas - que Ruta Sepetys nos mostra a dor silenciosa da guerra. Não se tratam apenas de batalhas, mas de lágrimas que mancham rostos com tanto sofrimento. Essa história nos lembra que por trás de cada estatística, há vidas partidas, escolhas impossíveis e sentimentos que nem o tempo apaga. Uma história sobre perdas, memórias e a busca desesperada por um futuro em meio aos escombros.


Quando minha amiga indicou a leitura, ela mencionou que seria uma história que ficaria comigo por muito tempo. Preciso concordar.


E você? O que achou? Já conhecia os fatos históricos que permeiam o enredo? Já leu algo da autora? Vou amar saber!



Até a próxima.

n.34


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